Rua 31 de Janeiro Ao fundo, igreja na Praça da Batalha |
A leste dos Aliados alguns pontos merecem uma espiadela. Faz isso, esse passeio vale um investimento de duas horitas. Apesar de uma grande interferência urbana, a zona, com muito comércio, ainda preserva alguns belos prédios "Arte Nova" (Art Nouveau), bons cafés e restaurantes. Uma idéia é partir da Estação São Bento e, logo na primeira rua à direita (Rua 31 de Janeiro), começar a bater perna por ali.
O nº 174 já mostra um bom exemplo, a casa Vicent (difícil não notar o dourado), onde hoje funciona uma loja modernex, a Bench. No nº 200 a antiga Ourivesaria Cunha segue a mesma linha, com a escultura "Grupo de Amores" acima da porta. Na esquina acima mais duas jóias: De um lado, a Casa Reis & Filhos – hoje uma loja streetwear - tem uma fachada preta bem diferente da Vicent, ultra-dourada. Tanto essa (Reis & Filhos) quanto a ourivesaria ainda conservam elementos originais. Se a curiosidade bateu, entra e vê. Logo em frente, a Livraria Latina se mantém como uma das mais antigas do Porto. Mas por que tantos detalhes? Logo que cheguei no Porto eu costumava parar cada dia em uma estação do metro diferente, sair e procurar um lugar novo para almoçar. Uma boa forma de conhecer aos poucos a cidade. Lembro-me bem que parei muitos dias na Estação Bolhão e andei muito nessa região. Mesmo que tenhas pouco tempo na cidade, aproveita e tenta tirar o máximo dela.
Antes de entrar à esquerda na Rua de Santa Catarina, cabe um "alô" sobre a Praça da Batalha. Os guias e sites sobre o Porto citam que o nome vem de uma sangrenta batalha dos habitantes do Porto contra os Sarracenos que dominavam a Andaluzia no Século X, liderados por Almançor (ou Al-Mansor). Os portuenses foram derrotados e a cidade foi completamente destruída. A Praça foi urbanizada em 1861 e em Fevereiro de 1927 houve uma não menos sangrenta batalha, dessa vez com metralhadoras e artilharia forte contra a ditadura militar, menos de um ano após a chegada de Salazar ao poder. Logo ao virar para a Praça, à esquerda, fica o Cine-Teatro Batalha (1908), que além de cinema e teatro (óbvio), oferecia exposições e shows. Depois da n-ésima remodelação, em 2006 passou a contar com os bares Disco Volante e um restaurante com esplanada, mas soube que voltou a fechar, o que é uma pena. Ao lado do Cine fica o Palácio da Batalha, que fez as vezes de hospital de sangue durante o já tão falado Cerco do Porto. A estátua em frente é do Rei D. Pedro V, o "Rei Muito Amado", neto de D. Pedro I do Brasil (filho de D. Maria II). Do outro lado da praça fica o Teatro Nacional São João, nome dado em homenagem ao então Príncipe Regente, futuro D. João VI. Inaugurado em 13 de Maio de 1798, seu aniversário, foi o primeiro edifício construído no Porto com a finalidade única de apresentar espectáculos. Após o incêndio que o destruiu em 1908, foi novamente inaugurado em 1920, com projecto de José Marques da Silva , o mesmo da Estação São Bento, Edifício "Grandes Armazéns Nascimento" (falo sobre esse em seguida) e do Edifício "A Nacional", o primeiro do lado esquerdo da Av. Dos Aliados. Essa fase coincidiu com uma actividade teatral decadente e o Teatro funcionou basicamente como cinema. Já degradado, foi adquirido pelo Estado e voltou a funcionar regularmente em 1995. Verifique a programação, esse seria um óptimo começo de noite no Porto.
É só escolher o espetáculo. Fonte: www.tnsj.pt |
De volta à Rua de Santa Catarina. Há um pequeno trecho em que carros e eléctricos circulam, mas a partir da esquina com a Rua de Passos Manuel e durante uns 500 m, só pedestres. Na esquina ficam as Galerias Palladium, onde já funcionaram os Armazéms Nascimento e o Café Palladium, referências de décadas passadas. A arquitectura é um destaque, hoje em dia comprometido por muita poluição visual e com o interior totalmente descaracterizado pela C&A e pela Fnac. “Vá lá que a Fnac não fica lá mal”, já ouvi isso, mas dá pena não ter conhecido o original, que durou até perto da década de 80. Dica: A cada 3 horas (3, 6, 9...) surgem do relógio quatro imagens que representam personagens relevantes do Porto: o Infante Dom Henrique, Almeida Garrett, São João e Camilo Castelo Castelo Branco. As imagens “andam” do lado de fora por dois minutos e depois entram para esperar por mais três horas.
O Camilo Castelo Branco foi o primeiro escritor tuga a viver exclusivamente da profissão. Apesar de ser alfacinha (lisboeta), estudou no Porto e aqui protagonizou uma história que merece mais um desvio do assunto desse post (que vai acabar maior do que devia). Ficou órfão cedo e teve uma vida que poderia ter sido contada em uma de suas novelas, se é que não as inspirou. Casou-se pela primeira vez aos 16 anos (em 1841) e aos 21, já vivendo na boemia, rapta outra mulher e vem para o Porto. Atitude o cara tinha. "A beleza é o poder moderador dos delitos do coração", dizia ele... É preso por bigamia e quando consegue a liberdade acha finalmente a mulher que nunca imaginara encontrar – Ana Plácido. Só que a gaja é casada com um rico comerciante brasileiro (mas, Ana...) e com isso o escritor resolve ficar recluso no Seminário do Porto, quando se torna amante de uma freira (mas, Camilo...). Não satisfeito, seduz e rapta Ana Plácido e passam algum tempo “a monte”, mas são presos (1860), acusados de adultério pelo corno brazuca. Inicialmente ela se entrega mas depois também ele, poucos meses após ter fugido à justiça. Foi na Cadeia da Relação, quando eu estava a visitar o CPF pela primeira vez, que eu soube dessa história fantástica. Lá ele escreveu Memórias do Cárcere (nada a ver com Graciliano Ramos) e deixou a opinião pública dividida entre a pegada romântica do caso e os padrões da época. O facto é que foram absolvidos e passam a morar juntos em Lisboa (1863), mas ainda não acabou. Dos seus três filhos, um era “oficialmente” do comerciante (o brazuca, lembras?). Com a morte deste, Ana passa a administrar a fortuna herdada pelo primeiro filho. Finalmente, em 1888, casam-se e continuam juntos para sempre. Nesse caso, até 1890, quando ele suicida-se. Ela viveu até 1895. É, tem horas que eu acho que, mesmo depois de já ter feito tanta coisa, minha vida é meio parada :)
O Camilo Castelo Branco foi o primeiro escritor tuga a viver exclusivamente da profissão. Apesar de ser alfacinha (lisboeta), estudou no Porto e aqui protagonizou uma história que merece mais um desvio do assunto desse post (que vai acabar maior do que devia). Ficou órfão cedo e teve uma vida que poderia ter sido contada em uma de suas novelas, se é que não as inspirou. Casou-se pela primeira vez aos 16 anos (em 1841) e aos 21, já vivendo na boemia, rapta outra mulher e vem para o Porto. Atitude o cara tinha. "A beleza é o poder moderador dos delitos do coração", dizia ele... É preso por bigamia e quando consegue a liberdade acha finalmente a mulher que nunca imaginara encontrar – Ana Plácido. Só que a gaja é casada com um rico comerciante brasileiro (mas, Ana...) e com isso o escritor resolve ficar recluso no Seminário do Porto, quando se torna amante de uma freira (mas, Camilo...). Não satisfeito, seduz e rapta Ana Plácido e passam algum tempo “a monte”, mas são presos (1860), acusados de adultério pelo corno brazuca. Inicialmente ela se entrega mas depois também ele, poucos meses após ter fugido à justiça. Foi na Cadeia da Relação, quando eu estava a visitar o CPF pela primeira vez, que eu soube dessa história fantástica. Lá ele escreveu Memórias do Cárcere (nada a ver com Graciliano Ramos) e deixou a opinião pública dividida entre a pegada romântica do caso e os padrões da época. O facto é que foram absolvidos e passam a morar juntos em Lisboa (1863), mas ainda não acabou. Dos seus três filhos, um era “oficialmente” do comerciante (o brazuca, lembras?). Com a morte deste, Ana passa a administrar a fortuna herdada pelo primeiro filho. Finalmente, em 1888, casam-se e continuam juntos para sempre. Nesse caso, até 1890, quando ele suicida-se. Ela viveu até 1895. É, tem horas que eu acho que, mesmo depois de já ter feito tanta coisa, minha vida é meio parada :)
Um assunto leva a outro, mas voltemos à esquina. Essa região da Passos Manuel é um caso à parte. Figuras da cena “cool” do Porto sempre pousam por aqui, tanto nos lançamentos de livros, exposições ou festas, enfim, assunto é o que não falta no “Maus Hábitos”. Além de um bar “descolado” para a noite, que fica aberto até as 4h nas sextas e sábados, oferece um bom almoço vegetariano. E é barato: O menu completo custa € 8 (entrada, sopa, bebida, prato, sobremesa e café) e o económico, sem sobremesa, € 6. É simples, mas é legal. Fica na Rua Passos Manuel 178, 4º andar. Em frente, no nº 137, o Cinema Passos Manuel propõe festas constantemente e apresenta cinema “cabeça”. David Lynch por lá é quase comercial...
E também por ali fica o Coliseu do Porto, uma casa de espectáculos Art Déco com 3000 lugares, muito frequentada pelos portuenses. Surgiu onde antes existia o Salão Passos Manuel, no início do século XX e, de acordo com o site, “Era um lugar elegante, sofisticado, moderno, baseado nos jardins parisienses da época, e proporcionava todo o tipo de entretenimentos: café-concerto, music-hall, esplanada e cinematógrafo”. Em 1995 foi objecto de interesse da Igreja Universal do Reino de Deus, mas resistiu ao assédio graças à intervenção de personalidades do meio artístico. Em 96 um incêndio prejudicou bastante as actividades do Coliseu, mas o espaço hoje oferece ao Porto uma agenda constante e diversificada. Lá eu vi, por exemplo, a Adriana Calcanhoto, o Emir Kusturica e a ópera Aida, de Verdi. Os lugares mais altos (e mais baratos) não são lá confortáveis... Para 2011 estão previstos Buena Vista e Stomp, antena-te!
Na primeira quadra do trecho pedonal (para pedestres) da Santa Catarina, dois belos prédios. À direita, nº 122 (ias ver de qualquer jeito), um dos lugares emblemáticos do Porto - o Café Majestic. Na inauguração chamava-se Elite, nome que deixava claro a qual público era destinado, nesta que já foi a área central da cidade (de certa forma, ainda é). Teve décadas de glória, mas da mesma forma que outros lugares da cidade, degradou bastante entre os anos 60 e os 80, quando finalmente foi reconhecido como património cultural. Adquirido pelos actuais proprietários, entre 1992 e 1994 foi inteiramente restaurado para apresentar novamente o traçado original. Segundo o site, “É a belle époque de volta ao Porto”.
E também por ali fica o Coliseu do Porto, uma casa de espectáculos Art Déco com 3000 lugares, muito frequentada pelos portuenses. Surgiu onde antes existia o Salão Passos Manuel, no início do século XX e, de acordo com o site, “Era um lugar elegante, sofisticado, moderno, baseado nos jardins parisienses da época, e proporcionava todo o tipo de entretenimentos: café-concerto, music-hall, esplanada e cinematógrafo”. Em 1995 foi objecto de interesse da Igreja Universal do Reino de Deus, mas resistiu ao assédio graças à intervenção de personalidades do meio artístico. Em 96 um incêndio prejudicou bastante as actividades do Coliseu, mas o espaço hoje oferece ao Porto uma agenda constante e diversificada. Lá eu vi, por exemplo, a Adriana Calcanhoto, o Emir Kusturica e a ópera Aida, de Verdi. Os lugares mais altos (e mais baratos) não são lá confortáveis... Para 2011 estão previstos Buena Vista e Stomp, antena-te!
É ou não é "chic" ?? |
Logo depois, à esquerda, fica o clássico Grande Hotel do Porto (1880), o mais antigo da cidade, que foi reformado em 2002 e certamente é uma boa opção de hospedagem.Verifica no site as promoções que o hotel sempre oferece, podem ser atraentes. Em 1889 foi este hotel o primeiro pouso em Portugal de D. Pedro II e da Imperatriz Teresa Cristina em Portugal, após a Proclamação da República no Brasil. Era 24 de Dezembro e apenas 4 dias depois a Imperatriz aqui faleceu. Vem daí o nome do elegante restaurante (D. Pedro II), estilo renascentista. Dica: Se estiver por ali na hora do almoço, o executivo da casa custa € 13,50, com entrada (sopa ou creme) e duas opções de prato. Bebidas à parte.
Mais uns passos e chegas à esquina com a Rua Formosa, onde, logo abaixo à esquerda, fica o Mercado do Bolhão. A idéia de concentrar os diversos mercados da cidade vem desde o Séc. XIX, mas o actual prédio (que precisa de uma boa reforma) foi inaugurado em 1914, onde um dia já houve uma nascente de água – uma bolha, como eram chamadas as nascentes – no terreno de uma quinta. Hoje o Mercado está no centro de uma grande discussão sobre a sua revitalização, com debates acalorados entre grupos que querem manter as características do Mercado e empresários que querem demolir todo o seu interior, construir apartamentos de luxo e centro comercial. Discussões políticas usuais entre os humanos... É um belo prédio, com uma diversidade interessantíssima de pessoas e artigos frescos, como flores e frutas, tudo dividido por zonas. De peixes e carnes até pequenos restaurantes, ainda traz a tradição do comércio local. Em volta dele ainda é possível conhecer algumas mercearias antigas, que vendem de tudo um pouco. A mais conhecida é a Pérola do Bolhão, mas se circulares por ali vais ver outras.
Na Rua Formosa, nº 303, fica o Clube Nacional de Montanhismo , do qual fiz parte por um pequeno período de tempo. Logo abaixo da “Pérola”.
Como sugestão, podes contornar o Mercado do Bolhão e, pela Rua de Fernandes Tomás, retornar à Santa Catarina. Logo na esquina dessas duas ruas a Capela das Almas (século XVIII) vai chamar a atenção, pela linda parede coberta de azulejos (1929) sobre a vida de São Francisco de Assis e de Santa Catarina. Desde o século XVI o azulejo é usado em Portugal para a ornamentação de interiores, mas no Porto este ícone estético tuga só é amplamente utilizado a partir do século XIX.
Dica: Como morei no Porto não há aqui no Sucatrips muitas dicas de hospedagem, mas um casal de amigos de Barcelona passou umas noites na Pensão do Norte (Rua Fernandes Tomas N.º 579) e gostou muito do custo-benefício. O hotel foi completamente reformado e fica bem no coração da Baixa do Porto e a 30 m da Estação Bolhão, linha F do metro, que vai da Estação de Comboios de Campanhã ao Aeroporto.
Por fim, ali pertinho fica o Via Catarina, shopping com marcas conhecidas (Geox, Nike, H&M, etc) e praça de alimentação com decoração tipicamente portuguesa.
A região pode ser vista a bordo de eléctricos (bondes), sendo os cartões Andante válidos para os trajectos. A Linha 22 circula entre a Batalha e o Carmo, passando pelas principais vias da Baixa (horário). A Linha 18 liga a Ribeira ao centro da cidade, no Carmo (horário). A combinação dessas duas linhas é um passeio fantástico pelo Centro Histórico do Porto, ao alcance de um título Z2 do Cartão Andante, que a essa altura já deves ter nas mãos!!! Veja o mapa. Linha 18 na Restauração, prestes a subir para o Carmo |
Ora, então diz-me lá. Tás ou não a gostar? Continua...
sensacional o seu blog
ResponderExcluirQue bom que gostou, Eva, obrigado. Se precisar de alguma opinião ou mais informação, diz-me!
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